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Sem Tédio

Meus irmãos e eu temos histórias hilárias de infância que as nossas crianças amam. Gostamos de lembrar de como eram as férias, o lazer, a simplicidade das brincadeiras e de como usávamos a criatividade para nos divertir até durante o castigo. Nem precisamos fazer um grande esforço mental, pois há pouco menos de 40 anos não tínhamos lista de exigências para os pais cumprirem nas férias; sabíamos que os adultos até podiam brincar feito crianças, mas não tinham “obrigação” disso; não conhecíamos a palavra tédio, por isso nunca diríamos “estou entediado (a)!” – frase tão comum entre os pequenos hoje.
Sem entrar no saudosismo melancólico dos velhos tempos, aproveito as férias de julho para questionar – e por que não?!
Tenho acumulado pérolas engraçadas e, ao mesmo tempo, sentido pesar quando frequento ambientes públicos com as meninas. É hilário ver pais e mães ensinando os filhos (já grandes) a subirem num balanço, a usar o parquinho do prédio onde moram! Mas, vem um pesar quando vejo a infância perdendo de usufruir o que é próprio da fase.
Tentativas e erros não devem mais fazer parte do repertório infantil? Virou coisa do passado?
Adultos interferem o tempo todo na interação e nas brincadeiras infantis na tentativa de diminuir o esforço das crianças?
E, quanto a parar o tempo, pausar o derretimento do sorvete, lutar contra a lei da gravidade, pregar cola no meio do escorrego só pra tirar a self perfeita? Claro que tem criança que se diverte com fotos e poses, mas a grande maioria não se agrada de parar a brincadeira para isso.
Como posso esperar o desenvolver da motivação intrínseca (de dentro de si mesmo) quando fico expectadora e plateia de tudo o que as crianças fazem, tornando-as até dependentes dos aplausos para tudo o que realizam?
É estruturante que elas aprendam a desenhar para o próprio apreciar, experimentem dançar, limpar, brincar, se fantasiar, pelo simples motivo de se sentirem leves, felizes ou engraçadas, fazer essas coisas pela exclusiva satisfação interior, sem que tenha alguém fotografando, aclamando ou aplaudindo.
Andando pela cidade percebi o malabarismo que as instituições religiosas fazem para “ganhar” mais participantes nas EBF’s: pula-pula, piscina de bolas, banda de ‘louvor’, piruetas, brindes e lanches… vale qualquer esforço! E, se sobrar tempo, fala-se de coisas espirituais…
Será que passam a mensagem de que as coisas espirituais são entediantes!?
Não precisam se escandalizar comigo! Eu defendo que as crianças precisam ter um espaço de acolhimento na igreja, de ensino bíblico dirigido, utilizando de linguagem própria e ferramentas lúdicas. Acredito que os que se dispõem ao serviço devem amar os pequeninos e se qualificar para ajudá-los a vivenciar experiências positivas no ato de se congregar.
Devemos também cuidar para que no ato de acolher, não coloquemos a criança como figura central das atividades congregacionais.
A igreja não é o “entretenimento” das crianças e a família não é o parquinho.
Os adultos (pais, tios, avós, professores, parentes) não precisam dirigir as atividades o tempo todo para serem figuras presentes.
É salutar que os pequenos entendam que adultos perdem a concentração, se cansam, necessitam de um momento de silêncio e descanso. As crianças precisam do respeito ao silêncio também para prepará-las para uma atitude devocional e meditação na Palavra – esse exercício deve começar o quanto antes. O tempo sozinho com Deus é a base do relacionamento com Ele, pois é preciso silenciar para escutar a Sua voz. É preciso aprender a quietude pra meditar nos preceitos do Senhor e isso não é entediante, não é monótono!
“O período ‘silencioso’ com Deus a cada dia representa o centro da vida do cristão, sem o qual todas as demais atividades ficam fora de foco.” (Faulkner & Brecheen, 2000, p.119)
Nós, pais e mães, somos abençoados quando educamos nossos filhos na instrução e conselho do Senhor (Efésios 6.4). As crianças tem, antes de tudo, uma jornada a caminho da eternidade e nós não podemos perder de vista o trabalho de cultivar as experiências que plantarão nelas o desejo de servir a Deus e aos outros. Desse modo, os incríveis momentos que desfrutamos na presença dos pequeninos devem ser de doação, de afeto, carinho, amor, sempre os ensinando a se colocarem no lugar certo – ao lado – e não no centro.
Referência: Falkner, Dr. Paul, Brecheen, Dr. Carl. O que toda família precisa. Ed. Vida Cristã, 2000.